SERÁ QUE OS MORTOS PODEM
COMUNICAR?
Por
Humberto Pinho da Silva
Havia na casa de meu pai – de
Santa Marinha (Gaia), – moça, que auxiliava no meneio doméstico.
Entrou ao serviço, ainda
adolescente, na flor da idade, e ficou décadas…
Cuidou com esmero de minha mãe,
na prolongada doença que a vitimou; e após a morte desta, tratou de meu pai,
com tanto carinho e dedicação, que passou a ser considerada, como se fosse da
família.
Sentindo-se doente e receoso
que a Ilda – assim se chamava a empregada, – ficasse desprotegida, meu pai,
resolveu deixar-lhe, por escritura, o direito de residência, e escassos meios,
que permitissem sustentar-se, pelo menos, nos meses seguintes ao funeral.
Mas, receando que não lhe fosse
fácil encontrar emprego, condigno, e a protecção que desejava, assentou
escrever carta, dirigida a Senhora, extremamente religiosa, de alma caritativa,
e influente na sociedade portuense.
Tanto a escritura – que lhe
permitia ficar com a casa, – e a carta, foram colocadas numa gaveta da cómoda
de pau-santo, que se encontrava no seu quarto, com conhecimento da Ilda.
Até aqui nada foi dito
merecedor de ser passado a letra de forma.
Aconteceu, que dias após o
funeral, foi recebido telefonema da destinatária da carta, narrando: que soube
do falecimento, pelos jornais, e que nessa mesma noite, tivera um sonho muito
estranho:
Sonhou, que meu pai lhe
aparecera, dizendo que procura-se uma carta, que lhe escrevera.
Como não sabia do que se
tratava, nem conhecia, que alguma vez lhe tivesse escrito, pensou ser apenas um
sonho…
Mas, como o “ pedido” não lhe
saísse da cabeça – segundo contou, – resolveu telefonar, para perguntar se
sabiam da existência de recado ou carta, que lhe tivesse escrito.
Esclareceram-na que havia
realmente sobrescrito, endereçado a seu nome, e que não lhe tinha ainda sido
entregue, porque aguardava-se oportunidade propícia.
Este facto ou fenómeno,
deixou-nos deveras impressionados, e foi muito comentado; depois caiu no
esquecimento.
Trago-o aqui, por o considerar
bastante curioso, e merecedor de se tornar publico.
Seria pura coincidência, ou o
sonho foi “provocado” por meu pai? É mistério difícil de compreender, e deixa
muitas interrogações, sem resposta.
Coincidência ou não, certo é,
que a missiva foi entregue.
O conteúdo era manuscrito,
pedindo que cuidasse do bem-estar da empregada, procurando protege-la no que
lhe fosse possível; pois esperava morrer brevemente e não a queria deixar, sem
ter a certeza que ela iria cuidar da Ilda, como merecia, pela dedicação e
provas de lealdade que demonstrou nos anos que esteve em sua casa.
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