ASILO DA EUROPA ?
Por
Humberto Pinho da Silva
Acabara de ler, no meu
periódico: cinquenta mil aposentados franceses, manifestaram o desejo de virem
viver para Portugal, para poderem ter fim de vida mais feliz, quando Silvério -
velho amigo de meu pai, - entrou na confeitaria da baixa, onde saboreava o cafezinho.
Curvado, olhos baixos, passos
incertos, amparado ao guarda-chuva, de haste de madeira, este intimo amigo de
meu pai, após o formalistico: “ boa-tarde”, pediu-me licença para se sentar à
minha mesa.
Já não sou jovem, mas Silvério
podia ser meu pai. Como fui educado a respeitar os mais idosos, aconcheguei-me
para a parede, permitindo assim, que pudesse sentar-se mais à vontade.
Como não havia assunto, e para
não escutar habituais lamúrias de achaques da velhice, contei-lhe a noticia que
acabara de ler. A resposta foi pronta e enérgica:
- “ Estamos transformados no
asilo da Europa! …”
Como argumentasse que era bom:
porque vêem divisas. Abespinhou-se, e, atirando-me olhos de indignação,
acrescentou:
- “ Somos o asilo dos velhos
da Europa e o hotel e restaurante dos jovens! …”
E continuou:
- “ Repara, meu velho: meu
pai dizia: No tempo da monarquia era uma vergonha. Veio a República, e até os
cidadãos venderam para a Grande Guerra!... Chegou Salazar: deu-nos paz e
liberdade de circular pelas ruas, sem ser assaltado, mas…os salários eram magrinhos!
…Surgiu a liberdade…
“Pensávamos todos, que
acabaria a miséria; mas o que se vê?!
“ Mais miséria!... Salários
baixos; e as reformas não sobem! …Só o salário mínimo… – dizem… Em breve todos
receberemos o salário mínimo! …
“A Europa despejou milhões!
A nação ficou melhor: mais rica; mas o povo?! Ficou na mesma ou ainda pior…Os
velhos nem dinheiro têm para se recolherem num lar! …; e os novos, se querem
vida folgada, têm que ir para fora! …
“ Gasta-se fortunas para
financiar o ensino. Para quê? Se, obtido o diploma, partem para longe! …”
Como lhe dissesse que dias
melhores virão. Que está a melhorar…Repostou de imediato:
- “ Isto não tem emenda! Foi,
e sempre será, terra que não interessa a ninguém! …
“ Diziam que a culpa era da
“ direita”…Veio a “esquerda”…Recebeste aumento?! Eu recebi míseros euros, que
eram parte do que me roubaram há cinco anos! …
“ Entretanto tudo subiu:
gasolina, electricidade…IMI… – parece que ser proprietário é crime! - Tudo…Tudo
sobe!
“ Os da “ esquerda” pregam
uma coisa, mas chegados ao poder… é o que se vê! …Até ficam mudos! …Bem dizia
meu pai: “ Querem conhecer o vilão, mete-lhe a vara na mão! …”
Tentei consolar o Silvério:
- “ As coisas vão melhor! Estão
a melhorar! …Portugal tem futuro! …”
Mal pronunciei “ futuro”,
replicou de olhos esgazeados:
- “ Desde menino que ouço
essa treta: Portugal, como o Brasil, são países de futuro; mas nunca do
presente! …”
Desisti. Tentei dar outro rumo
à conversa. Falei de Futebol, da Fifa, dos Jogos Olímpicos, de novelas
televisivas…; tudo que anestesia os ânimos exaltados…
E Silvério saiu de cara
desanuviada, e até com sorriso de felicidade nos lábios.
Nada há melhor para amainar
pessoas nervosas, do que o Futebol e o Carnaval. É remédio santo: já os
imperadores romanos sabiam…
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