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segunda-feira, 25 de abril de 2016

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Segunda-feira, 25 de Abril de 2016
ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS - O DECLINAR DE UM GRANDE IMPÉRIO
                           














O declínio do nosso Império acompanhou, passo a passo, o declinar da própria saúde do Imperador D. Pedro II, personalidade marcante, profundamente entranhada no imaginário e na mentalidade dos brasileiros de sua época. De tal modo o imperador representava, simbolizava e personificava toda uma ordem de coisas política, social e cultural que, por assim dizer, generalizou-se a ideia de essa ordem não poderia sobreviver ao velho monarca.
O que faltou foi uma maior explicitação e conscientização de que o regime monárquico transcendia muito a pessoa do monarca, por mais paradigmático e carismático que este fosse. Faltou uma fundamentação doutrinária que, expressa em termos acessíveis aos homens da época, representasse um "exorcismo" suficientemente poderoso para resistir às tentações e aos cantos de sereia das novidades republicanas.
Normalmente, atribui-se o fim do Império e a proclamação da República a três causas principais: a abolição da escravatura, a questão militar e a questão religiosa. Esses três pontos, realmente, sinalizam três importantíssimos apoios do antigo regime que, por razões diversas, lhe foram retirados e permitiram o advento da República.
A Abolição, sobretudo tendo se realizado às vésperas de uma colheita, produziu grande descontentamento entre os proprietários rurais, força conservadora de grande prestígio social e político, de si um dos sustentáculos do regime. Os republicanos, que mais tarde se gabariam de terem sido abolicionistas, eram, na sua maioria, escravocratas e criticaram o Treze de Maio.
A questão militar deveu-se, segundo entendo, à falta de habilidade política dos sucessivos gabinetes que governaram o país desde o final da Guerra do Paraguai (1870). Estando em ascensão uma nova classe dirigente civil, já formada nas Academias de Direito e não mais saída, como outrora, das academias militares, os militares foram se sentindo cada vez mais alijados dos grandes postos administrativos. Um pouco de diplomacia e jeito teria resolvido o problema, mas sucessivas medidas foram tomadas de modo a desagradar as cúpulas das forças armadas. O cúmulo da humilhação foi a nomeação de Calógeras, um civil, para a Pasta da Guerra.
Por fim, a bem conhecida questão religiosa cindiu a tradicional sustentação mútua Trono-Altar. Neste ponto concreto parece-me inegável uma contradição interna do regime, que, rejeitando a fundamentação religiosa de sua remota origem, de fato recusava o apoio de seu mais sólido sustentáculo moral.
Desejo chamar aqui a atenção para um outro elemento que contribuiu, a meu ver de modo decisivo, para o fim do Império. Para quem leu "Ordem e Progresso", de Gilberto Freyre, fica claro que havia um certo fator psicológico presente na sociedade brasileira nas últimas duas décadas do regime monárquico, por onde o advento da república parecia incoercível. Até mesmo monarquistas ferrenhos pouco a pouco foram se resignando à ideia de que a república significava o futuro. Alguns até reconheciam a república como um ideal em tese desejável, se bem que não alcançável a prazo breve. O próprio D. Pedro II, segundo consta, teria declarado que preferiria ser presidente de uma república a imperador.
A doutrina e a mentalidade positivistas que então impregnavam a sociedade considerada moderna viam a História como o resultado de uma evolução incoercível, e a transição da monarquia para a república seria etapa necessária de tal evolução. Só não se sabia quando se daria essa transição.
Assim sendo, o debate entre monarquistas e republicanos já não mais se travava sobre as virtudes e vantagens de cada regime político, mas passava a ser sobre se convinha ou não fazer logo a mudança. Os monarquistas já não tinham coragem de combater a república em seus pressupostos doutrinários e ideológicos, mas, timidamente, limitavam-se a dizer que "o Brasil ainda não estava preparado para a República".
Recordo de ter lido, nas Memórias de Chateaubriand, que ele, ainda jovem, serviu no exército contrarrevolucionário do Duque de Brunswick, formado por emigrados da nobreza para combater a Revolução Francesa. Da narração de Chateaubriand se depreende que esse exército não poderia estar fadado senão à derrota, já que os jovens aristocratas que serviam em suas fileiras estavam profundamente impregnados da mentalidade enciclopedista e voltairiana, e nutriam admiração pelos ideais revolucionários que, não por convicção, mas por mera força de um atavismo familiar, combatiam com armas na mão.
Analogamente, nos anos 70 e 80 do século XX, quando o domínio mundial do comunismo parecia inevitável, muitos burgueses amolecidos declaravam-se simpatizantes do socialismo e diziam ser este o regime do futuro, contra o qual era impossível resistir. A esse ponto havia chegado o entreguismo e a falta de convicção na justiça da causa que, enquanto burgueses, teriam todo o interesse em defender.
Esses dois exemplos, o do exército amolecido e pouco motivado de Brunswick, e o da burguesia mais recente a que me referi, parece-me que servem como referenciais para se compreender como o Brasil monárquico de 1870-1889 foi sendo minado e perdendo a convicção da legitimidade de seu sistema.
Acrescente-se a isso o mimetismo, o espírito imitativo e macaqueador tão próprio do nosso povo, e compreende-se que tenha preferido imitar o modelo das republiquetas hispano-americanas.
                               



ARMANDO ALEXANDRE DOS SANTOS é historiador e jornalista profissional, membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

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